“A hora do encontro é também despedida, a plataforma desta estação é a vida.”
Na plataforma desta estação, com olhar adiante e passos firmes no alto de sua anabela, projetou Gorete, seu caminho.
Determinada, forte e fraca, fez-se uma mulher notável.
Quando os obstáculos lhe apareciam, inusitadas formas de transpô-los ela encontrava.
Necessitando de ajuda, enfrentou um dos homens mais temidos da cidade, o “algoz alemão”, Padre Pedro Paulo Michla.
Ganhou dele presentes que até o fim falava com grande gratidão: o custeio de seu último ano de estudos e um moderníssimo armário especializado para seu consultório.
Tornou-se então, a primeira dentista mulher de Santo Antônio do Monte, abrindo caminho para as outras que viriam depois.
Exerceu sua função profissional, que adorava, com maestria e muitas vezes filantropicamente. Era adorada por todos os seus pacientes, mas paciência mesmo quem tinha era ela, que se tornava amiga, confidente e até mesmo psicóloga deles.
Com seu penteado impecável, rotineiramente igual e um piscar de olhos forte, parecia que queria limpar o olhar para enxergar mais fundo e mais longe. Tão longe que não foi mãe, porém, foi pai, mãe e irmã de sua família. Família que ela transformou em filhos seus. E eram muitos! Crianças, jovens, adultos e idosos, aos quais ela dedicou toda sua vida com verdadeiro afinco de mãe, pai e a amizade de irmã, sempre suprindo a carência humana emocional e material que seus pais não puderam dar.
Um cais, sonho e desejo voraz de embarcações em alto mar tempestivo ou quando à deriva. Ancoradouro seguro.
Foi muito amada pela maioria de seus filhos. Quem a amou, amou-a realmente. Ficou para aqueles poucos, apenas o desconforto de seus interesses mesquinhos.
Sabia amar como ninguém, não só com o coração, mas principalmente com atitudes, uma de suas maiores virtudes.
O seu carinho maternal era cativante, sua ansiedade era perturbante e sua dedicação a tudo que se propunha a fazer, era inconfundivelmente contagiante. Causava admiração a muitos.
Teve vários amores: amores imaginários, amores mal conhecidos, amores não correspondidos, amores proibidos, amores perdidos e amores concluídos, como toda ou quase toda mulher.
Era dona de uma firmeza impecável, e mesmo que a insegurança se aproximasse, logo era vencida pelo cansaço, como acontecia também em outras circunstâncias.
Inteligente, sábia, cumpriu com bravura o tempo que lhe foi dado, e lutou com coragem até a última plataforma do seu caminho com extensa bagagem em mãos, no alto de sua anabela.
Então chegou a nossa única certeza humana universal: o fim.
A morte, a morte, a morte e a morte de Maria Gorete Cabral, foram várias, infelizmente, lentamente, de pouco em pouco.
Ê trem doido, sô! Diria um bom mineiro.
E Deus, meu bom Deus, resolveu levá-la, como fará com todos nós.
Aos nossos olhos a indignação e a estranheza das ações divinas. “Tirou sabiamente, a única que não tinha filhos.” . Pensamos nós. Mal interpretamos, pois foi muitos os filhos órfãos que ela deixou, conclusão que só algum tempo mais tarde foi elucidada em nossas mentes e corações. Maior a estranheza e maior a indignação. Quão enigmático é nosso Deus!
Quão sublime amor!
Minha Mãe, Mãezinha, Mãezona, pai e irmãzinha Gorete.
Escute se é pra escutar...
“...SABE,
ESTA SAUDADE,
É SUA AUSÊNCIA!...”
(Trecho da letra de uma de suas músicas)
*26/07/1954 / +25/07/2000
Carneiro
Sonhar mais um sonho impossível,
Lutar quando é fácil ceder,
Vencer o inimigo invencível,
Negar, quando a regra é vender
Trecho da música "Sonho Impossível",
Versão feita por Rui Guerra e Chico Buarque
O trecho do livro Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, em que teve por base a canção acima:
Sonhar o sonho impossível,
Sofrer a angústia implacável,
Pisar onde os bravos não ousam,
Reparar o mal irreparável,
Amar um amor casto à distância,
Enfrentar o inimigo invencível,
Tentar quando as forças se esvaem,
Alcançar a estrela inatingível:
Essa é a minha busca.
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